domingo, 26 de setembro de 2010

As visitas da 3ª cirurgia

Praticamente não houve. Como já postei antes, nós fomos responsáveis pelo seu quase isolamento.
Recebíamos visitas dos seus irmãos.Um dia um irmão mais velho veio busca-lo para irem juntos dar uma volta. Foram a um lugar que vende plantas em Cravinhos. Seu irmão deu-nos um vasinho lindo.
Outro irmão, mais novo que ele, aparecia com mais frequencia. Um dia convidou-o para irem a um bar muito rústico que servia espetinhos. O João gosta muito. Eles foram numa 6ª feira a noite. O irmão caçula foi uma outa vez e trouxe um monte de picolés de frutas de um lugar que ele descobriu. Adoramos.
Começamos a sair com maior frequencia. Visitávamos os pais do João com grande regularidade. Ele dizia que não se sentia muito bem lá, não queria ir sozinho. Só eu dirigia. Ele dizia ficar triste com a "alienação" da mãe, que passava fases alternadas, entre lúcida e confusa.Ficava deprimido com a fraqueza que o pai apresentava após a cirurgia da perna.
O pai dele também se emocionava muito quando o via. Um dia pediu para falar comigo em particular. Chorou muito , preocupado com o João, ele percebia que ele estava diferente, como se tivese problema mental. Eu o confortei. Não, não precisávamos de nada, obrigada.
Disse que ele poderia ficar tranquilo, que ele já tinha feito demais por todos nós de sua família. Agora era hora de nós fazermos por ele.
Não, não precisamos de dinheiro, obrigada. Temos muita reserva para que o João ficasse sem trabalhar neste período. E não, eu não estava cansada. Eu amava o João e NUNCA deixaria que nada lhe faltasse, incluindo aí a minha presença e atenção.

Ainda meu diário

Enquanto almoçávamos na minha mãe percebi que o João as vezes saia do ar.
Percebi também que quando conversamos com seu amigo que foi nos visitar ele se referiu ao casamento da minha filha como um evento que ainda iria acontecer, quando na verdade, o casamento tinha ocorrido há 2 anos. Eu o corrigi e ele , não sei de onde tirando um lance de lucidez, disse " estou falando da comemoração". ????
Depois do almoço dormimos um pouco e eu disse que iria sair. A diarista estaria com ele. Aliás, eu NUNCA o deixava sozinho. Só saía quando o meu genro podia ficar com ele, ou quando a diarista ia trabalhar.
Eu montei, meu genro digitou, um quadro com todos os telefones muitissimooooos úteis, como por exemplo, meu celular, celurar das minhas filhas, telefones fixos das filhas , celular dos genros, telefones dos irmãos, médicos, meus pais.... Esse quadro ficava bem visível na cozinha. Assim, se a diarista precisasse de mim ou de algúem elas nos localizaria com facilidade.
Eu também sempre pedia que ela me ligasse assim que ele acordasse, para eu voltar logo e ele não se sentir sozinho.
Quando eu cheguei em casa, ele estava na varanda, sentado no mesmo lugar de sempre, olhando o movimento da avenida.
Eu o beijei, conversei um pouco e perguntei se ele sabia o nosso endereço, ele disse que não.
Ele disse que gostava de sentar ali e observar que tinha 2 semáforos. Um feminino e 1 masculino. Ao meu espanto, ele disse "estou brincando"
Ele sempre reage assim. Não sei que mecanismo ele usa para se defender. Ele sabe quando o que falou causa estranheza e sempre argumenta que estava brincando.
Gastamos $2,00 -------agua mineral no posto
$13,00-------"carolinas" no posto

$8,50--------2 cópias de chave.
Ele fez questão de deixar um dinheiro na minha mão.
A noite, depois da vinda da minha minha filha mais nova com o marido, após
conversarmos um pouco, ele quis ir pra cama.Ele sempre vai dormir mais cedo.
Tomou os remédios. Disse que me amava e dormiu.

sábado, 25 de setembro de 2010

Ainda dia 17/09/2009

Ajudei o João a se vestir, calcei seu tenis, penteei seu cabelo, coloquei pasta na sua escova de dentes,ele sorriu.
Tomamos nosso café da manhã e fomos para nossa caminhada. Passos lentos, mãos dadas, conseguindo um equilibrio.
Como de costume, paramos na loja de conveniência do posto de gasolina no fim da avenida, tomamos água.Pedi para o João para começarmos a fazer alguns exercícios de memória. Eu não tenho a menor noção de que exercícios aplicar. Preciso tentar, começar, depois procurarei por orientação.
Pedi para a funcionária me emprestar uma caneta , peguei alguns guardanapos de papel e pedi para que ele escrevesse o número do nosso telefone.Ele não consegiu.
Eu então, escrevi-os e pedi para que ele copiasse. Não deu certo.
Pedi para ele escrever enquanto eu ia ditando.Não dava ainda para ele saber se quando eu ditava "NOVE", ele teria que representar o algarismo 8, 9 ou 6. "Qual é o nove mesmo?" Muito triste.
Almoçamos no apartamento. A diarista veio, minha filha caçula com o marido também.
Fizemos uma comida simples. Justo hoje, veio um amigo visita-lo. Convidei-o para comer conosco e fiquei feliz que aceitou. Paciência. Eu não estava na minha casa(que fica em outra cidade e tenho cozinheira que comanda tudo).
Gastos de hoje:
$24,00-----------medicação
$39,00-----------lanche da noite no shopping
$20,00-----------protetor solar ( O João tem a pele muito clara e seu irmão hoje me criticou que ele está se queimando muito nas caminhadas, posso?)
$50,00----------diarista
$02,00----------dinheiro para comprar o pão do café de amanhã.


O João cismou que queria comprar uma furadeira. Eu quero pendurar umas fotos na parede, para que ele sinta nosso apartamento, onde só usamos para os fins de semana quando ele não está de plantão,como o nosso LAR.
Só Deus sabe quando volto para casa. Já fez um mes da cirurgia, dia 08/09.

Bom, ele comprou:
1 furadeira---------$80,00
1 cx de brocas------$42,00
ganchos-----------$06,00
1 martelo-----------$17,00
1 alicate-----------$39,00
1 gancho pendurar toalh $23,00
2 pilhas------------$6,00
2 T de tomada-------$9,00

Quanto gasto! e o Banco do Brasil só solta algumas folhas de talão...

Ainda relendo meu diário

17/09/2009
Foi difícil acordar hoje.Mais difícil ainda ter que levantar.
Que sono! os olhos não abrem, o corpo está rígido, sinto dor muscular.Que calor.
Levantei quase sem enxergar.João tem sede. Está na hora do remédio (Puran).
Eu deixo os remédios da noite na mesma gaveta do criado mudo,na verdade o criado mudo só tem 1 gaveta.
Mas o Puran , ele toma ao acordar, algun tempo antes do café da manhã.
Coloco suas meias elásticas, 7/8, digo bom dia, beijo-o e agradeço a Deus por mais um dia com ele. É muita coisa!.Cada dia que passa é mais um passo para sua recuperação total.
Lembro quando minha filha mais velha nasceu e eu tive depressão pós parto.
Eu também agradecia a Deus toda manhã, quando acordava, porque eu sabia que uma criança com mais 1 dia de vida era uma criança mais forte e mais velha, o que diminuia consideravelmente a chance dela morrer.Eu temia não saber cuidar de um bebê. Achava que a perderia...todo dia a mesma angustia.
Eu não daria conta.
Como rezei para eu ficar doente e voltar para o hospital, porque assim teria alguém para cuidar dela e de mim.Eu morava só nesta cidade, com o João. Nenhum parente.
Mas, como eu ia dizendo, acordei tonta, com a boca seca,os olhos pesados, com a sensação que eu tinha entrado numa briga.
Confundi os remédios do João!!!!!!
E , pior, quando ele quis conferir, me senti agredida: "Como Assim?"
Pior ainda, ele estava certo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Me sinto desamparada e incompetente. Eu sou péssima. Ele só pode contar comigo e eu falho desse jeito! morte para mim!

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

que vergonha esta política!

Não, já é demais.Acabei de ver na tv, a Marta Suplici,que sempre foi conhecida pela defesa da mulher, psicóloga, sexóloga e afins, numa propaganda, ao lado do Netinho,HOMEM QUE BATE EM MULHER, sentadinha e risonha , pedindo voto.
É o fim da picada!que contraste!O que se não se faz pelo poder e dinheiro...
O PRESIDENTE pedir voto para HOMEM QUE BATE EM MULHER!!!
Por que este povo não fica doente?

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

E para o cuidador, nada?... e o cuidador ,o que é o qué?

Hoje é um dia que eu não deveria estar escrevendo. Mas senti falta disso.
Minha filha mais velha disse que o blog não é uma terapia.Acho que ela está certa.Mas eu preciso conversar, e principalmente torcer para que eu seja lida pelos profissionais da área da saúde,que eles saibam como é a vida atras do "palco".
Muitas vezes me pergunto se quem trata do paciente imagina como é a vida dele.Claro que NÓS (me incluo também) não podemos nos envolver emocionalmente com cada caso,porque não poderíamos trabalhar com objetividade.
Mas, e pensar só um pouquinho PODE?
A expectativa de cada atendimento é tão grande, o medo da verdade, a ansiedade é tão devastadora... e quando o momento chega, passa tão depressa.Tudo o que gostaríamos de perguntar foge da cabeça. A vontade de desabafar foge.
Algumas palavras, um sorriso e até a próxima.
E nós cuidadores? que direito temos? podemos chorar, reagir, deixarmo-nos levar pela emoção?podemos ter medo pelo paciente e pelo nosso futuro?
E o direito de nos aborrecer, ficarmos chateados, indignados, ofendidos...
Temos o direito de desanimarmos?de sentir que tudo está muito pesado,embora amemos intensamente o nosso paciente?
Podemos nos sentir pessimistas de vez em quando? e egoistas?
Chorar , só escondido.Dar e dar,dar sempre.
Quem cuida de nós?dormir até mais tarde, entregar-se ao cansaço, não ouvir, não falar, não responder. E por causa de tudo isso, não ser julgado como fraco, omisso, sem fé, sem esperança, sem piedade. Não imaginarem que não nos colocamos no lugar do paciente, que não imaginamos que um dia poderia sermos nós, cuidadores, naquela situação.
Bobagem minha.Já passou.
Estou bem de novo.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Continuando com o Diário

16/09/2009 4ª FEIRA:
Que surpresa! Deus me ouviu muito rápido!
O João levantou de manhã, colocou a mesa do café na varanda, cortou mamão( e a mão também),descascou banana,colocou água para fervar.Que bom meu Deus!
Mas ele colocou 4 lugares, 4 xícaras, porque achou que tinham mais 2 pessoas no apartamento. Eu perguntei quem poderiam ser aquelas 2 pessoas. Ele respondeu :"qualquer 2 pessoas".
Não domi bem a noite. Calor, insônia. Acho que o João teve pesadelo a noite, porque se mexeu muito, falou, resmungou.
Acho que vou comprar um gravadorzinho para fazer algumas entrevistas com ele. Ele está tão diferente, parece outra pessoa.Quem sabe um dia não escrevo um artigo sobre tudo isso?
Quero ir na manicure!!!
Depois que ele acordou do sono do almoço, fomos juntos ao cabelereiro.Ele faz questão de ir comigo.
Gastei $25,00.
Almoçamos com nossa filha caçula e o marido. Eles pagaram a conta.
A noite fomos visitar o meu sogro que tinha quebrado a perna e feito uma cirurgia.Depois da visita o João quis dar uma "esticadinha" e fomos a um café muito charmoso.
Gastamos $45,00.

Total despesas:H2O no posto----$2,00
Mousse Cake-----$45,00
Farmácia--------$23,00
Pagar conta CLARO molden internet-----------$85,00

Meu Diário, continuação II

15/09/2009 :
Em casa, 20:00 hr. Horário do nosso lanche da noite. O João não lembrava se tinha tomado o remédio.Disse:" Já tomei 1 comprimido e meio do remédio branco".
"que remédio branco? voce toma 2 tipos de remédios que são brancos! porque não esperou que eu lhe desse os remédios? como voce os achou?"
Ele toma 2 comprimidos brancos, inclusive o Hidantal, anti convulsivante. Mas nenhum deles é para ser tomado apenas meia unidade.
"por favor, eu lhe peço de novo, não tome seus remédios sem que eu os dê a voce".Chorei de novo.
Ainda na cozinha perguntei COMO ele estava , ele respondeu que estava em São Paulo. Ele não tinha entendido a pergunta.Perguntei , então, se ele sabia onde estava.Ele disse :" no Exterior de São Paulo".Eu queria saber se ele tinha noção que nós estávamos em nosso apartamento, e não na nossa casa, ´distante 70 kms dali.
"estamos no condomínio Santa Ângela", ele disse.
"não. Estamos no NOSSO apartamento"
"Não querida, aqui é um hospital para receber pacientes com trauma de abdomem". Não consegui evitar que as lágrimas fossem saindo uma a uma
-"não chore,tem outros hospitais como esse"
-"Aqui não é um hospital!É seu apartamento. Você pagou por ele. É seu. VocÊ comprou!"
-"Eu sei que todo mundo já pagou,nós também?"
-"é seu. Você tem todos recibos. Está pago.Este lugar é só SEU", chorei de novo.
Ele me olhou com muita compaixão e continuou:
-""você não sabe quantas vezes vejo você TRAVESTIDA de minha esposa, dizendo que o apartamento é meu, que eu dei 10 cheques, só para me consolar" e dessa vez ele chorou.
Chorei mais ainda :"quem sou eu? como você me vê?"
-"de roupa casual e com muitas forças"
Chorei de novo. Vou ligar amanhã logo cedo para seu neurocirurgião para perguntar se isto é do remédio.Acho que ele está piorando!hoje cedo ele estava tão lúcido, tão situado...embora durante o almoço na minha mãe ele tenha dado algumas ratas.Que vontade de chorar...
Meu Deus, quando tudo isso vai passar?

Meu Diário, continuação

15/09/2009- Fomos ao supermercado Pão de Açucar. O João fazia questão de ir comigo fazer compras.Não sei se por costume, por querer sair e sentir-se conectado ou por qualquer outro motivo, inclusive o controle do dinheiro. Mas sempre ia comigo.
Na hora de pedir a carne não conseguia se explicar, o açougueiro nãO entendia. Eu queria muito interferir, mas forcei o máximo a independência dele. Será que não era melhor para sua auto estima?
Antes do açougue fomos para parte das frutas.Ele colocou a banana no carrinho e logo depois perguntou o que precisava comprar.Eu disse que precisava comprar carne. Ele então olhou para a banana no carrinho e perguntou:"mas aquilo não é carne?"
"não, bem, isso é banana"
"banana????"
Ele então pediu para pegar na mão e perguntou de novo:" o que é isso?"
"banana" respondi de novo.Ele então disse:" se nãO é carne então não precisa comprar!".
Fiquei assustada. Na hora de pagar peguei a fila do caixa preferencial.O funcionário me olhou e fez sinal que entendia que o João era um doente.
Ele não conseguia pagar, não diferenciava o dinheiro, não fazia conta e mostrou o dinheiro que tinha no bolso para o funcionário "escolher".Gelei.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Ninguém me perguntou...

Quando o João foi se recuperando da terceira cirurgia e se mostrando tão diferente, eu entrei em pânico. Nossas filhas estavam sempre tentanto me reanimar.Diziam coisas bonitas, dispunham-se a me ajudar. Queriam sair comigo, me levar a cabelereiro, tomar cafezinho no shopping center,comprar revistas...
Mas elas também foram aquiescendo, com extrema delicadeza me diziam que já não acreditavam mais numa recuperação total.
Elas queriam me fazer acreditar que minha vida teria alguns aspectos legais, mesmo que isso implicasse em sair da casa que que moro, a qual construimos há mais de 20 anos, mudar para nosso apartamento em outra cidade,provavelmente parar e trabalhar e viver para ele, que precisaria tanto da minha presença.
Ao ouvir delas que talvez ele nunca mais seria ele mesmo, eu tive uma crise de revolta.
Por que não me perguntaram antes se eu prefereria ele cego ou bobo?
Eu não teria concordado com a cirurgia, teria deixado o tumor crescer, tentar a radioterapia que o deixaria sem enxergar, mas o manteria conosco.
Eu queria meu marido de volta, custasse o que custasse.

Na calada da noite...

Quantas vezes, enquanto observava o João dormindo, naquele leito estreito do hospital, com medicaçao correndo na veia, com o pijama todo repuxado para um lado só,dormindo tão quieto...o quarto quente demais, um ineficaz condicionador de ar antigo, eu dormindo num sofá que, para virar cama, era preciso apenas colocar as almofadas nas pontas, mas nada o deixava mais largo; a bandeja com o lanche da noite intocado,com um leite frio e um café
quase gelado, um pacotinho com 3 bolachinhas de sal, o açucar num copo descartável...
Quantas vezes , com insônia, eu apenas o observava e lembrava do seu vigor...suas mãos tão fortes, grandes e muito macias a me tocar...seu olhar malicioso, um risinho de deboche atrás de uma promessa tão quente.Um amante insaciável, gentil, delicado, e ansioso para agradar.
Tantas vezes me perguntei onde ele tinha aprendido tantas formas de fazer uma mulher feliz.
Quando o conheci eu tinha apenas 14 anos, ele era meu professor.Eu nunca tinha namorado um "adulto".Cai de amores. E ele durante os 7 anos de namoro, sempre me respeitou tanto, me tratou com tanta delicadesa, falava o quanto era importante para ele que eu me guardasse para nosso casamento.
Eu o amava tanto, faria qualquer coisa para tê-lo para sempre. Mas ele me tratava como uma menina, "minha jóia" como ele dizia.
Esperei pelo casamento para ver o quão viril, másculo, poderoso ,sensual e sensível ele era.
Valeu tanto a pena!
Com o passar dos anos, o que era ótimo foi ficando maravilhoso. Momentos e momentos de amor , incansável esse meu João.
Por muitos momentos pensei em escrever um livro com contos eróticos!
Que atrevida era eu. Mas muitas vezes me pegava pensando nele, com uma emoção que me deixava ansiosa para estar com ele de noite, no nosso canto.
E o seu bom humor então, sua perspicácia, sua generosidade.
Deus meu, me devolve meu marido.

domingo, 5 de setembro de 2010

Meu diário.

Abri meu diário sobre a cirurgia apenas hoje.
A primeira anotação que vejo é sobre contas.
Dia 15/09/2009: $50,00 diarista
$20,00 conserto de alguma coisa
$02,00 água mineral no posto
$141,00 supermercado
$ 05,00 florzinha(afinal, a vida precisa de um enfeite)

Era diferente para mim, fazer registro de gastos.Sempre tivemos uma vida
confortável, com praticamente nenhum controle de coisas pequenas como estas.
Não tínhamos vida de luxo, mas o dia a dia era perfeitamente administrado com segurança de acordo com nossos ganhos.
Tínhamos 1 empregada fixa, há 5 anos conosco, 1 lavadeira e passadeira, jardineiro, limpador de piscina, e uma diarista quando necessário.
Bons restaurantes a cada 1 ou 2 semanas, barzinhos toda semana, viagens curtas regularmente,fins de semana encomendávamos comida em restaurantes ou rotisserias, se por acaso estivéssemos na cidade.
Agora a situação tinha mudado. O João não estava produzindo.Seu sócio respeitva o acordo que tinham, e seu salário como médico do serviço público estadual chegava regularmente, mesmo ele estando de licença. Ele também tinha uma pequenininha aposentadoria, e um aluguelzinho de um apartamento ,também pequenininho, que temos.
Mas, o GROSSO da nossa sobrevivência vem da produção do João no consultório, cirurgias e etc.
Agora a situação era realmente diferente. Começamos a temer o que antes parecia meio distante.Precisávamos ter mais cautela.
Inclusive, porque todos os pagamentos da casa eram realizados por ele.
Todo mes, ele abre uma folha e faz seu checklist de despesas fixas e eventuais e a quitação das mesmas. É ele quem vai ao supermercado( ele diz que eu não sei escolher como ele), vai ao açouge, farmácia, abastece os carros,paga água, luz, telefone (ele não gosta de débito automático, porque pode perder o controle do saldo, que ele consulta regularmente no caixa eletrônico),IPTU, salário de empregados, UNIMED da nossa filha que mora em Ribeirão ( mesmo ela casada, ele diz que ele tem que assumir o melhor plano para ela, independentemente se o casal tenha outro ou não),celurares,e assim por diante.
Ele paga TUDO, LITERALMENTE. Não apenas dá o dinheiro. Ele efetua o pagamento.Ele diz que só confia na memória dele.
Dá para entender o desespero que fiquei com sua doença? até os seguros de vida, e outros investimentos só ele domina.
Se só ele tem boa memória na família, conforme ele diz, e agora que ele não tem memória mais?

Voltando ao assunto...

Em algum momento, durante a recuperação da terceira cirurgia, tive a idéia de escrever um diário. É, um diário.Eu queria registrar tudo o que estava acontecendo, porque eu sabia que mais tarde eu esqueceria muita coisa.
Aliás, é típico meu.Quando eu era criança, por não ser "rancorosa", eu sempre esquecia as raivas do dia.Então, eu brigava com minha mãe ou irmãs, chorava, dizia que nunca mais iria amá-las e no dia seguinte... eu acordava rindo e nem lembrava do que tinha acontecido.
Um belo dia, acho que eu tinha uns 12 anos,eu resolvi "documentar" todas as brigas.Comecei a escrever com riquesa de detalhes toda mágoa que porventura tivesse tido.No dia seguinte, antes de aparecer para o café da manhã, eu relia minhas anotações; e aí sim, eu tratava todo mundo como merecia.
Bons tempos aqueles, que para eu sofrer tinha que ler primeiro...